Publicado originalmente no Cultura e Mercado por Leonardo Brant e retirado em 06/09/2011 do endereço:
http://www.culturaemercado.com.br/analise/pais-rico-e-pais-com-cultura/
Redes e movimentos culturais lançam novo manifesto, exigindo postura de continuidade do Minstério da Cultura em relação aos programas, editais e propostas de ação do governo Lula.
Iniciado pelo Movimento Mobiliza Cultura, conta com o apoio do Movimento Nacional dos Pontos de Cultura, Movimento PCult (Partido da Cultura), Circuito Fora do Eixo, Casa da Cultura Digital, Congresso Brasileiro de Cinema (CBC), além de coletivos, cineclubes e outras agremiações e movimentos organizados que encontram resistência na interlocução com o MinC comandado por Ana de Hollanda.
O estopim para a retomada do movimento, que no começo do ano exigira a saída de Ana de Hollanda do Ministério da Cultura (#foraanadehollanda), foi a demissão voluntária de Marta Porto da Secretaria de Cidadania e Diversidade. Nos primeiros rascunhos do manifesto, os movimentos chegaram a atribuir a “autoria” da demissão da secretária.
O movimento é legítimo, luta por uma agenda política progressista e por alguns pontos fundamentais para o desenvolvimento da política cultural brasileira. Reflete, sobretudo, a inabilidade política do novo ministério, que se recusa a compor com forças políticas dentro do próprio PT e de partidos aliados, como PCdoB, que perderam espaço no novo MinC.
Mas é, ao mesmo tempo, uma agenda muito genérica e requentada, cheia de palavras-de-ordem, vazias de significado prático. E traz um equívoco de leitura política, ressaltando o protagonismo e os pontos positivos da gestão anterior, sem relativizar os problemas deixados por ela, como a dívida do #ficajuca, pagamentos atrasados de editais e pontos de cultura e fragilidade jurídica de muitos programas e ações, à deriva.
Pelas redes, a central de boatos dá conta de um processo de demissão em massa no MinC, a partir da crise deixada pela demissão de Marta Porto. Nem o secretário-executivo Vitor Ortiz foi poupado, com sua saída anunciada pela Veja Online. Falei com ele no fim de semana e ele desmentiu o boato. Disse que sua demissão nunca esteve em pauta.
Vamos acompanhar os próximos passos dessa nova crise, que coloca a ministra em situação política delicada perante o governo Dilma, pois foi provocada dentro do próprio MinC, justamente num momento de lançamento de agendas positivas, o que ajudaria o governo a espantar as dificuldades provocadas pela crise econômica que se aproxima do Brasil e pela faxina ética que resultou na demissão de três ministros.
O racha entre a ministra e a secretária Marta Porto se deu justamente pelo boicote ao trabalho de articulação e reposicionamento que a secretária vinha fazendo em sua pasta, chamando a atenção para os principais pontos de continuidade de programas como o Cultura Viva.
No mínimo, Ana de Hollanda demonstrou falta de liderança e baixa capacidade de compreensão do momento político brasileiro, pautando a condução do ministério de maneira unilateral e condizida pelos valores e crenças pessoais, desconectada das questões políticas que envolvem a pasta e desconsiderando a opinião da sua equipe, como no caso do Creative Commons.
Por essa e outras razões, o manifesto torna-se legítimo e pode se transformar num importante instrumento de luta por mais e melhores políticas culturais.
Para assinar o manifesto, envie e-mail para mobilizacultura@gmail.com
Leonardo Brant http://www.brant.com.br
Pesquisador independente de políticas culturais, autor do livro "O Poder da Cultura". Diretor do documentário "Ctrl-V | VideoControl, criou e edita o site Cultura e Mercado. É sócio-diretor da Brant Associados, consultoria para desenvolvimento de negócios culturais. Para mais artigos deste autor clique aqui
Leia o manifesto na íntegra:
PAÍS RICO É PAÍS COM CULTURA
O povo brasileiro tomou nas urnas a decisão de construir um país rico, soberano e democrático.
A cultura do Brasil, seus produtores e agentes em sua mais rica diversidade, se engajou desde o começo do governo Lula no projeto de universalização do conhecimento, do acesso à produção de bens culturais e na distribuição do poder simbólico, econômico e político. Em outras palavras: construir agora o Brasil do futuro, apostando no desenvolvimento e na inclusão, contando com a “inteligência popular brasileira” e a imaginação dos povos dos Brasis.
Por isso, durante os dois governos Lula, a sociedade civil organizada, os coletivos e redes, produtores e agentes estabeleceram uma inédita e saudável relação com o governo no sentido de construir um projeto de cultura para o Estado Brasileiro. A herança maior das duas últimas gestões à frente do MinC é a constituição de uma rede imensa e capilar que vai dos mestres da cultura popular aos hackers.
Durante o governo Lula estas redes não foram apenas atendidas pelas políticas públicas, senão que tornaram-se os sujeitos do processo, fazedores de cultura e de país. Tal legado é patrimônio de todos aqueles que lutaram pelo projeto de nação encabeçado por Dilma Rouseff.
A Crise Estrutural do MinC
Passados 8 meses de governo, segue a crise do MinC, cujo último episódio foi a saída da Secretária de Cidadania e Diversidade Cultural, e as ameaças de novas demissões e desentendimentos.
A sociedade civil organizada, produtores e agentes culturais, parlamentares, ativistas de dentro e de fora do campo cultural, entendem que esta é a hora de uma correção de rumo no Ministério da Cultura.
É necessário uma repactuação com os movimentos culturais que construíram e deram apoio à política pública de cultura gestada no governo Lula e sua continuidade, avanço e ampliação no governo que elegemos. Não podemos mais aceitar que as conquistas e avanços da sociedade brasileira no campo cultural, chanceladas pela sociedade civil e pelo Estado e tornadas públicas no Plano Nacional de Cultura continuem a ser desrespeitadas e ignoradas.
País rico é país com democracia participativa e por isso não podemos aceitar o rompimento do diálogo construído com os movimentos e agentes em gestão compartilhada nos 8 anos do governo Lula. Estes mesmos avanços nos últimos 8 meses do governo Dilma Roussef sofreram retrocessos ou estão paralisados,
diante da crise de legitimidade e confiança na qual se vê submerso o MinC.
Os movimentos culturais organizados estão buscando há 8 meses a retomada da experiência de co-gestão e participação da sociedade civil nos rumos da Cultura.
Todos os esforços estão sendo feitos para essa repactuação, por isso reivindicamos que as novas mudanças sejam debatidas e consultadas de forma franca e ampla junto aos movimentos culturais que estiveram durante esses últimos meses e nestes 3 dias de agosto e inicio de setembro reunidos em Brasília, em diálogo direto com todas as Secretarias do Ministério da Cultura (com exceção da Secretaria de Cidadania e Diversidade Cultural,
demissionária).
Destacamos os pontos fundamentais defendidos por diferentes movimentos, que vem sendo debatidos desde a primeira crise do MinC:
- A implementação do Plano Nacional de Cultura aprovado pelo governo Lula;
- A aprovação da PEC 150 e do Procultura como enviados para o Congresso;
- A publicização do texto final da Reforma da Lei dos Direitos Autorais e seu envio ao Congresso, mantendo-se os avanços propostos pela sociedade em consulta pública; entre eles a fiscalização de instituições como o ECAD (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição), e a criação de Instituto ou Agência Reguladora na área de direitos autorais, estímulo a produção de conteúdos culturais, educacionais abertos, descriminzalização da cópia e o estímulo ao uso de licenças flexíveis, como o Creative Commons;
- A defesa do Programa Cultura Viva, a manutenção dos 3 mil Pontos e Pontões de Cultura e suas ações. O pagamento de todos os Editais, Renovações dos convênios de Pontos e Pontões, a manutenção e expansão da Rede dos Pontos de Cultura, a contemplação de novas redes e a definição de um novo marco legal.
- Retomada do protagonismo nacional e internacional em Cultura Digital, conquistado pelo MinC, no governo Lula.
- Retomada dos programas de Diversidade Cultural, abandonados nesta gestão.
- Aprovação da Lei Cultura Viva, Aprovação da Lei dos Mestres e Griôs.
- A Revisão da proposta orçamentária para o Minc em avaliação no Congresso Nacional, que canaliza grande parte das verbas da cultura para obras e infraestrutura, inviabilizando as demais ações do Programa Cultura Viva (rede dos Pontos de Cultura, Ação Cultura Digital, etc.) de forma desproporcional e assimétrica.
- Defendemos também o maior diálogo do Ministério da Cultura, com nossa participação, em ações transversais com os demais ministérios, particularmente com o MEC, Ministério das Comunicações, Ministério da Ciência e Tecnologia, Ministério do Trabalho e em ações como a do Plano Nacional de Banda Larga.
O MinC somos nós e nosso compromisso é com o viável e com o possível.
Por tudo isso, solicitamos à Presidenta Dilma Roussef, aos parlamentares, ativistas, sociedade civil e movimentos culturais e sociais que juntos possamos estancar as crises sucessivas no Ministério da Cultura, para repactuarmos o compromisso assumido entre o Estado brasileiro, os movimentos culturais e a sociedade civil de um projeto de continuidade, inovação e avanços na cultura brasileira que esteja à altura do papel que o Brasil assumiu como protagonista e referência na cena global em termos de políticas culturais inovadoras.
É preciso que nos unamos ao redor de um projeto no qual a cultura seja convocada de fato a cumprir sua vocação de inventora de futuro, desenvolvimento, soberania, sustentabilidade, democracia e inclusão social.
É preciso confiança na Cultura Brasileira!
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