Entre os dias 5 e 7 de fevereiro estive reunido com diversos gestores, pesquisadores, produtores, artistas e outros trabalhadores do setor cultural, no III Seminário de Economia da Cultura em Uberlândia, discutindo um tema instigante: CULTURA, da sobrevivência à existência.
Em primeiro lugar, agradeço a honra de ter sido convidado pelo idealizador do seminário, Rubem dos Reis, gestor cultural e colega de Conselho Estadual de Política Cultural-CONSEC, e de dividir a mesa com Israel do Vale, jornalista e presidente da Rede Minas, Luciano Alves, secretário municipal de cultura de Rondonópolis-MT, com mediação foi de Aníbal Macedo, vice-presidente do CONSEC. Além da alegria e do prazer de conviver com os demais convidados, equipe de produção, o Grupontapé de Teatro, da Balaio do Cerrado e todos os envolvidos no evento.
Escrevo para relatar um naco, que foi minha participação, num evento de grande relevância para nosso setor, com um tema ainda mais relevante, então sigamos.
O Rubem, como disse, me convidou para falar sobre “Ideias que deram certo” e logo fiquei com o bicho-carpinteiro remoendo minha cabeça. Quando recebi a primeira versão do material de divulgação, com as apresentações de cada um dos convidados, chamou-me a atenção que me apresentaram como editor de uma revista cultural, pronto. Logo descobri sobre o que dizer.
A primeira coisa que pensei e fiz foi mostrar onde fica este danado do Vale do Mucuri, mostrar um pouco de nosso trabalho por aqui, como andam as coisas no setor e lá foi a história da Revista Mucury. Em resumo, um projeto que dá certo sem grana, infelizmente. Por isso só sai uma linda edição por ano com a parceria do Estúdio COMBO – Viviane Silva e Adélia Braga – e da Clarice Palles, nossa editora, de todos os antigos colaboradores e evidentemente todos os 55 autores de diversos estados e países e línguas. Afinal, é o que faz a Revista Mucury ser mais sortida que a feirinha do Veneta.
O Luciano Alves detalhou sua labuta na construção de uma política pública de cultura, a partir da criação e implantação do Sistema Municipal de Cultura de Rondonópolis, apesar das adversidades todas, que de modo algum são poucas. E o Israel do Vale pautou sua fala na premência de pensarmos a cultura de forma sistêmica, setorial, lembrando a experiência da Fábrica do Futuro em Cataguases e mesmo da iniciativa do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior-MDIC e Ministério da Cultura-MINC com o lançamento de edital conjunto para a elaboração de Planos de Desenvolvimento de Arranjos Produtivos Locais-APLs de Economia Criativa – em MG, foram contemplados o Polo Audiovisual sediado em Cataguases e o APL de Gemas e Artefatos de Pedra de Teófilo Otoni.
Relatadas as experiências, de perto e de longe, caímos na armadilha da transição proposta no tema: como atravessarmos o vale de lágrimas da mera sobrevivência como setor e partirmos para a existência? O que é nosso sucesso? O que é dar certo? A que custo e quais os resultados que alcançamos?
Aí o Aníbal me fuzilou: “Bruno, você vive de quê?”. Foi mais ou menos isso. A resposta é que não vivo de cultura. E esta não é só minha, e ainda pode ser ampliada, quem vive dignamente de cultura? Há muito menos que se deveria. Ou ainda mais, como um setor que se pretende tão importante na composição socioeconômica de uma comunidade pretende sustentar-se? Esta é a armadilha e a pergunta que nos faz engolidos por esfinges diversas.
No dia anterior, a partir das palestras do Antônio Eleilson, coordenador de cultura da ONG Ação Educativa de São Paulo e do Henrique Portugal, do Skank, a pauta estava proposta: Como transitarmos da mera sobrevivência de nossas ações, projetos, para a existência?
No último dia, 7 de fevereiro, com a participação do superintendente de fomento e financiamento, Felipe Amado, do secretário do estado de Cultura, Ângelo Oswaldo e do Israel do Vale, como presidente da Rede Minas, discutimos amplamente sobre onde pretendemos chegar e começamos a proceder conforme o conselho do professor José Lasmar, da Fundação João Pinheiro que no primeiro dia nos fez refletir sobre a urgência de transformar nossas necessidades em demandas, para que sejam reconhecidas e adotadas na agenda política para o desenvolvimento. Este é um dos caminhos.
Nos últimos tempos, inclusive por este site/blog, venho discutindo questões relacionadas ao fomento e financiamento à cultura, ao desenvolvimento da política cultural, em especial em nossa região. É necessário aprofundarmos e irradiarmos o debate, é preciso que pensemos a cultura e seus arranjos locais, seja em encontros, seminários ou fóruns, além de buscarmos alternativas. Mas não é possível que nos posicionemos como setor econômico sem um grande debate acerca da necessidade de políticas de desenvolvimento para o setor.
Foi nesse sentido que elaboramos um documento final do III Seminário de Economia da Cultura, intitulado “EXISTIR E VIVER, Carta de Uberlândia”, no qual convidamos a sociedade e o setor cultural a se mobilizarem para que possamos concluir esta transição da sobrevivência à existência e cumprir nosso papel no desenvolvimento econômico, social e humano.
Ps.: Ah, e todo mundo aprendeu onde é o Vale do Mucuri, e deve ter sido a região mais citada, inclusive pelo Secretário de Cultura de Minas Gerais.
Segue a íntegra do documento:
EXISTIR E VIVER
- Carta de Uberlândia -
O III Seminário de Economia da Cultura realizado em Uberlândia entre os dias 5 e 7 de fevereiro discutiu e reafirmou a Cultura como fator primordial para o desenvolvimento humano e econômico da sociedade e das cidades. O melhor ambiente para realizar ações inclusivas, de resgate e ampliação da cidadania. Esta perspectiva já norteou a construção do Plano Estadual de Cultura elaborado pelo Conselho Estadual de Política Cultural em parceria com a Secretaria de Estado de Cultura, a partir de amplo diálogo com a sociedade.
O tema do Seminário propõe uma transição, “Cultura, da Sobrevivência à Existência”, e nas discussões ecoaram a necessidade de entendimento das realidades e das culturas regionais, suas demandas locais e a forma como o Estado interage com o cidadão. Considerando seu aspecto econômico, essa transição se fará na medida em que haja o entendimento acerca da cultura como um setor econômico e que se invista na economia da cultura e seus arranjos locais. Dada sua dinâmica e potencial de transversalidade e inserção - social e administrativa, as atividades artística e cultural transcendem a mera formalidade do entretenimento e de maneira contundente e organizada se apresentam como uma ferramenta para que o Poder Público estruture práticas de gestão inclusivas e que atendam satisfatoriamente a população - especialmente aquela em vulnerabilidade social, ampliando o sentimento de pertencimento e a percepção de cidadania.
As atividades culturais e artísticas podem, e devem, ser protagonistas nas conquistas e avanços sociais, uma vez que estão presentes na sociedade de maneira lúdica, contundente e transversal, utilizando as linguagens próprias de todos os extratos e segmentos sociais potencializando sobremaneira investimentos em áreas como saúde, educação e segurança pública.
E é nesse momento de sobressaltos econômicos e sociais, que conclamamos a sociedade a nos apoiar nessa jornada que tem como objetivo central valorizar nossas identidades, ao mesmo tempo em que busca nos inserir mais fortemente nas lutas pela melhoria do desenvolvimento humano, social e econômico de Minas Gerais.
* Clique aqui para acessar fotos e mais informações sobre o III Seminário de Economia da Cultura.
Um dos momentos mais interessantes na recente luta do segmento cultural de Minas na busca de uma identidade e de uma política pública para o setor.
ResponderExcluirMuita luta para lutar!
Muito caminho para trilhar.
Mas com luz no meio do túnel!
Parabéns Bruno pela participação e intervenções!