Retirado do blog Sistema Nacional de Cultura em 29/01/13 do endereço:
O discurso de proteção e promoção à diversidade cultural definitivamente já tomou lugar no cotidiano dos gestores públicos e de grande parte da sociedade. Numa sociedade democrática todo mundo “acha legal” a diversidade cultural, defende políticas de inclusão para todos (mesmo que com diferenças no formato), e quase sempre tem algo a falar sobre o tema.
Porém, transformar os princípios da diversidade cultural em prática cotidiana de indivíduos e instituições nem sempre é fácil. Precisamos pensar, ao conectar os temas de diversidade cultural e inclusão cultural, em criar alternativas que possibilitem igualdade de oportunidade de acesso sob várias ópticas: diversidade de linguagens artísticas, de estilos, de idiomas, de formatos de ação cultural, de lugares dentro da cidade, de faixas etárias. E, como não poderia deixar de ser, diversidade de horários. Como os cidadãos têm vidas diferentes, lógicas diferentes de organização do horário, moram em diferentes (e distantes) lugares das cidades, se uma reunião pública quer que todos tenham a oportunidade de estar presente, teríamos que pensar em analisar estas várias configurações de horário para planejar mais horários diferenciados mais locais da cidade para que mais pessoas pudessem optar por estar presente.
Ao conversar com uma pessoa mais simples sobre política pública, percebemos alguns elementos de um dos principais desafios do SNC: envolver a TODOS na discussão sobre a criação do Sistema Nacional de Cultura, não apenas artistas e gestores. Para alguém que trabalha de segunda a sexta, de 8h às 18h, é complicado participar de reuniões durante este horário. O ideal seria termos mais de uma reunião em diversos horários para que as pessoas pudessem organizar seus “horários disponíveis”, facilitando o processo de participação. Na mesma medida, para alguém que mora nos limites das cidades, longe das sedes ou centros, como pensar em “atravessar a cidade” para participar com regularidade?
Um limitador é o fato de a maioria das equipes de órgãos públicos de cultura ser pequena. Muitos gestores já trabalham “no limite”, até com muito esforço, mas sem poder exigir que suas equipes trabalhem fora do seu horário padrão. É um dilema… Alguns sugerem que os gestores talvez pudessem propor flexibilidade na equipe (uma pessoa da equipe poderia trocar seu turno e trabalhar um sábado pela manhã ou um dia à noite), mas como lidar quando o gestor tem apenas duas pessoas e o órgão não pode simplesmente fechar as portas para que um dos funcionários troque de turno? A situação priora na precariedade de compreensão dos setores administrativos ou financeiros da maioria das prefeituras e órgãos públicos das outras esferas sobre as peculiaridades da área cultural.
Ouvimos uma moça esta semana que discutia CULTURA num passeio comum, próximo à Avenida Paraná, centro de Belo Horizonte, MG. O tema tinha diretamente a ver com o momento nacional. Era uma moça simples (depois ela disse que trabalha como secretária num prédio no centro), que talvez não estivesse em nenhum mailing ou entre os contatos de nossos órgãos públicos de cultura, mas a vontade dela em discutir a coisa pública era genuína. Ao aproximar dela, apresentamo-nos um ao outro e falamos um pouco sobre sistema nacional de cultura, sobre espetáculos, sobre oportunidades. A frase final dela na conversa provocou uma reflexão sobre a necessidade de estratégias específicas para envolver efetivamente o cidadão comum nas discussões de interesse público: “José Junior, eu queria participar destas reuniões de fórum de políticas culturais, de conferência de cultura, mas como é que eu faço se acontece sempre em horário que eu não posso ir por causa do meu trabalho???”. E completou “Não adianta eu chegar pro meu chefe e falar que é pro bem de todos, que veremos os resultados depois e tudo mais… O senhor acha que os empregados, como eu, estão relegados ao lugar de nunca poder participar? Na conferência municipal de BH, em 2009, por exemplo, como eu podia participar se moro pra lá de Venda Nova (um bairro de Belo Horizonte bem distante do centro) e as reuniões sempre terminam muito tarde”.
Pré-conferências regionais, caravanas descentralizadas, reuniões à noite ou sábado, conteúdos facilitados para pessoas mais simples são algumas das estratégias que poderiam ajudar, mas esbarram na escassez de recursos e dificuldades de mobilização dos órgãos públicos e na desconfiança e até pouco compromisso por parte da sociedade civil. Ou todos os envolvidos fazem um esforço complementar (governos viabilizando horários alternativos e reuniões em vários pontos da cidade, para várias faixas etárias diferentes e envolvendo o ambiente da escola pública e sociedade civil comprometendo-se mais e organizando-se regularmente) ou não conseguiremos atingir boa parte das metas do Plano Nacional de Cultura até 2020.
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