Publicado originalmente por Leonardo Brant no Cultura e Mercado e retirado em 14/03/2011 do endereço:
http://www.culturaemercado.com.br/conversacao/comecodeconversa/choque-de-gestao/
Mangabeira Unger já dizia, durante o curto período que fez parte do governo Lula, que o Brasil precisa de burocracia. Ele se referia àquela burocracia boa, que dá fluxo aos processos e permite, por exemplo, que um projeto chegue à mesa de um parecerista sem sumir no meio do caminho.
Burocracia é uma palavra muito mais associada às dificuldades geradas pelos funcionários públicos para realizar seus deveres do que a um elemento facilitador, que permite transparência, efetividade e fluxo na administração pública.
Há uma associação, não necessariamente verdadeira, entre gestão pública e burocracia. E uma mais perigosa ainda, de que a gestão cultural emperraria o desenvolvimento de programas inovadores, como o Cultura Viva. É o exato oposto disso.
Investir em gestão pública significa transformar política governamental em política de Estado, traduzindo a vontade do governante em processos administrativos bem definidos, com fluxos de trabalho, rotinas, metodologias. Tudo isso está a serviço de um objetivo construído e compartilhado com toda a sociedade. Dá vazão, sentido e efetividade aos desejos e definições estratégicas.
Sem gestão nos deparamos com um regime de exceção permanente. Cada tarefa, por mais conhecida e incorporada que seja, volta à estaca zero toda vez que precisa ser realizada. Cada funcionário que entra precisa aprender de novo o que já está aprendido e a máquina pode parar a qualquer momento para ter que corrigir um problema banal e cotidiano.
Não é raro observarmos um gestor estratégico investindo um bom volume de tempo em tarefas operacionais. Muitas vezes associamos esse tipo de gesto como humildade, mas na maioria das vezes significa apenas desorganização e revela uma perigosa disfunção, sobretudo se estivermos falando de gestão pública. Grandes temas e oportunidades cedem lugar aos kafkanianos afazeres cotidianos.
Diálogo e cooperação são premissas da gestão cultural. Quem associa gestão cultural com sistemas fechados, hierárquicos e autoritários, não está acompanhando a grande evolução das novas metodologias implementadas não só por organizações culturais, mas também governos e grandes corporações.
O choque de gestão anunciado pelo #novoMinC tem a ver com responsabilidade. As boas ideias precisam muito mais do que boa vontade, amparada por discursos precisos, que ecoam se acomodam bem na sociedade. Elas precisam ser realizáveis.
A democracia cultural precisa deixar de ser utopia, vontade, promessa para se tornar realidade.
Leonardo Brant http://www.brant.com.br
Pesquisador independente de políticas culturais, autor do livro "O Poder da Cultura", diretor do documentário "Ctrl-V | VideoControl, criou e edita este "Cultura e Mercado". É sócio-diretor da Brant Associados, consultoria em desenvolvimento de negócios culturais. Para mais artigos deste autor clique aqui
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