terça-feira, 1 de novembro de 2011

O poeta João Evangelista homenageando Drummond

O nosso amigo João  Evangelista Rodrigues comentou nossa postagem sobre o dia de D-rummond, mas foi tão bonito, e nos conduz a outras questões também, que decidimos reproduzi-lo. Além de concordamos em gênero, número e grau.

Olá, merecida homenagem para o nosso sempre amado Drummond. Mas quando pensamos em João Cabral, Manuel Bandeira, Mario Quintana, Mário Faustino e tantos outros grandes poetas pensamos que seriam necessários o dia A. o Dia B, o Dia C,o Dia D ....

Bonita escolha e quem sai ganhando é a poesia, que assim certamente será mais conhecida , lida e respeitada como uma das formas de criação mais original e profunda do espírito humano.

O Namorado da Poesia


Na Avenida Carlos Drummond
em Itabira
a poesia é pouca
bem menos que a mentira
algumas casas de branco
onde alguém se desconfia
da sacada da janela
só a janela se espia
mas vê de tudo lá fora
atrás da porta do dia
na Avenida Carlos Drummond
em Itabira
a poesia é pouca
bem menos que a catira
alguém se troca na esquina
por dois mil réis e um relho
lá se foi o tempo do onça
agora a moda é mais fina
quem não trabalha descansa
e a vida não termina
na Avenida Carlos Drummond
em Itabira
a poesia é pouca
bem menos quem admira
a vida vale dinheiro
vale aço-ferro-tudo
vale assim no mundo inteiro
vale feijão e veludo
mais depois da Vale a vida
é só um vale morto-mudo
na Avenida Carlos Drummond
em Itabira
a poesia é pouca
bem menos que nossa ira
algumas vendas venais
algumas dores venéreas
algumas donas de preto
alguns anéis de cristais
alguns doutores obesos
todos mineiros-iguais
algumas rezas noturnas
algumas pedras a mais
algum baralho escondido
sob a luz dos castiçais
algum olhar de bandido
todos mineiros-rivais
alguma virgem fingida
subindo a rua Santana
alguma dama remida
seguindo a mesma avenida
onde a vida Itabirana
segue seus passos normais
na Avenida Carlos Drummond
em Itabira
a poesia é pouca
bem menos que sua lira
a noite desce de névoa
cobrindo casas e sonhos
os anjos ruflando as asas
desenham formas no ar
parece até que o menino
está querendo voltar
a noite tece de sombras
a memória da cidade
o menino persegue a banda
segue a rua de seu Pai
onde Drummond se escondeu
no corpo da liberdade
onde Drummond o poeta
que fugiu - que desertou
e era ainda tão moço
quando inhá moça o chamou
onde Drummond - ninguém viu
onde Drummond - quem levou
será que foi nego véio
ou foi quebranto de amor
será que moço fugiu
será que moço voou
no dorso de um foguete
que ele mesmo inventou
onde Drummond - ningém viu
onde Drummond - quem levou
o certo é que o poeta
suverteu-se evaporou
caiu nas águas do rio
e a corrente o levou
vive trancado com ela
a sete chaves de ouro
e come e bebe com ela
e dorme na mesma cama
e só a ela responde
mesmo se o mundo o chama
por causa dela o poeta
comete qualquer loucura
dança no meio da praça
se despe da roupa escura
e gira e ginga e pirraça
se inventa e se procura
por causa dela o poeta
enfrenta um touro espanhol
enfrenta dura viagem
planta paisagem no sol
e dança e canta e revolta
cavalgando um caracol
só não volta a Itabira
na Avenida Carlos Drummond
pois a vida não responde
é só minério e memória
nesse mistério de bronze
fechando a porta e agora?

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