terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Sherlock Holmes – gincana e Kong Fu*

11/1/2010 - 12:54

Thais,


Finalmente, concordamos. Você tendo detestado, nem pretendia ver. Mas acabei indo, na esperança de que, desta vez, estivessemos de acordo. Sherlock Holmes é mesmo lamentável. Depois das nossas discordâncias sobre Bastardos Inglórios e Avatar, estava preocupado com a possibilidade delas serem um insanável problema de geração.
Com apenas uma semana em cartaz, Lula, o Filho do Brasil foi substituído por Sherlock Holmes no cinema em que assisti os dois filmes. E Avatar, repetindo o sucesso mundial (em 4 semanas, nos Estados Unidos, rendeu US$ 429 milhões), continua firme, ocupando as melhores posições do mercado brasileiro desde o Natal. Agora, com a chegada por aqui de Sherlock Holmes, tudo indica que Lula, o Filho do Brasil irá penar para se manter à tona.
Segundo declaração do distribuidor, Bruno Wainer, ao Globo ( 9/1/10 ), “o problema do filme foi o massacre político que ele recebeu, o que prejudicou seu lançamento”. Tenho minhas dúvidas se essa terá sido a razão do resultado comercial inferior ao esperado. “Massacre político” parece exagerado e seria preciso comprovar que comentaristas e críticos de cinema tem o poder de afastar o público do cinema. Fora isso, desconcertante que o distribuidor considere Lula, o Filho do Brasil um “programa para toda a família”. Estou para ver um adolescente, frequentador de cinema, que tenha interesse pela saga de um retirante nordestino que se torna líder sindical. Parece natural que, entre os dois, Avatar seja o preferido dos jovens. O Joaquim, que achou o filme longo, não é um adolescente padrão.
Até que ponto a imprensa tem ou não influência no fracasso ou sucesso de um filme é questão em aberto. Na verdade, os jornais mais divulgam e informam do que criticam. Ignoram alguns filmes e abrem espaço generoso para outros, usando critérios difíceis de entender. Você viu a primeira página do Segundo Caderno, do Globo de ontem (10/1/10). É toda dedicada, com direito a continuação na página 2, a Nine, filme musical dirigido por Rob Marshall. O autor da matéria, Artur Xexéo, descreve o filme como “…uma sensível homenagem a Federico Fellini e, por extensão, a todo o cinema italiano de 40 anos atrás.” Depois, afirma que é uma idéia original e um “musical-cabeça”, e completa considerando que “os números musicais são tão bons […] quanto os de Chicago. Mas, entre um e outro, resta ao espectador acompanhar a depressão de Guido.” Nos parágrafos finais, informa que o filme foi massacrado pela crítica americana e um fracasso comercial quando estreou nos EUA. Quantos leitores irão ou deixarão de ir ao cinema por terem lido essa matéria? Eu fiquei tentado a ir. Em geral, gosto de filmes depressivos. O que me parece desproporcional é o espaço dedicado ao filme, considerando o que é dito do “musical-cabeça”. Você não acha? Mas, quem somos nós para opinarmos sobre os critérios editoriais do Segundo Caderno? Quando tiver visto Nine, por favor, não deixe de me dizer o que achou.
Voltando ao Sherlock Holmes, “uma gincana de lutas marciais”, nas suas palavras, com as quais concordo inteiramente. Como, então, você explica que seja aplaudido no Globo (8/1/10), tenha chamada na primeira página da Folha de S.Paulo (8/1/10) e meia página da Ilustrada? Rodrigo Fonseca, responsável pelos aplausos, diz que o filme “de Conan Doyle quase nada tem” e que os personagems são gaiatos. Já a Folha reproduz declarações do diretor, Guy Ritchie, dizendo que “sua versão não descaracteriza os personagens nem as histórias originais.” Como ambos parecem ser apreciadores de rinhas, poderiam se enfrentar para dirimir a questão. Ainda na Folha, Ricardo Calil parece não ver incompatibilidade entre a cotação “bom” para Sherlock Holmes, e dizer que é “uma máquina hollywoodiana bem azeitada, eficiente e impessoal. A trama de mistério […] é banal, mas cumpre a função de reapresentar os personagens”. Para mim, se além disso ele ainda considera que o filme carece de substância e estilo, a cotação deveria ser “ruim”.
Quanto ao público, Thais, essa é a grande problemática, como dizia um grande amigo, nascido fora do Brasil, a respeito de outra questão. A julgar pela sessão de sexta-feira (8/1/10), está indo ver Sherlock Holmes e gostando. Nos Estados Unidos, o filme rendeu US$ 165 milhões desde a estréia, e tem tudo, como Avatar, para ter uma boa carreira comercial no Brasil. Como é que você se sente desta vez, não gostando de um filme que agrada à multidão?


Beijo,


Eduardo

* Eduardo Escorel é cineasta e ensaísta, dirigiu “O Tempo e o Lugar”, escreve sobre cinema para a Revista Piauí. O texto foi retirado no dia 12/01/2010 do blog questões cinematográficas: http://www.revistapiaui.com.br/blog/questoes_cinematograficas/post_31/Sherlock_Holmes_%96_gincana_e_Kung_Fu.aspx

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