Publicado Originalmente por Andreaha San no Cultura e Mercado e retirado em 29/12/2010 do endereço:
http://www.culturaemercado.com.br/pontos-de-vista/artista-ou-foca-amestrada/
Este ano houve uma liberação de verba significativa do MINC à produção cultural. Levando em conta a escassez de sempre, houve progresso no sentido material. Por outro lado não houve retorno, ao produtor cultural ou ao artista, que se traduza em transparência quanto as escolhas ‘cometidas’.
A definição de critério por parte da iniciativa pública orientada à cultura, é no mínimo suspeita de abuso de poder. Neste caso seria adequado uma discussão sobre concursos públicos que dão prêmios para artistas tão interessantes quanto outros tantos que ficam de fora. Prêmios nos moldes que circulam por intermédio da Funarte e do Sesc. Contra a natureza do artista, são segmentados e criteriosamente programados para atender a diretrizes de ordem política. Quando resistimos a um tal procedimento, somos apontados como românticos e fora da realidade. Uma intransigência ao ‘olhar’ do outro que chega a impressionar. Toma-se a realidade como um bem restrito, e quem pensa diferente está excluído. Que tipo de artista é esse que se submete ao enquadramento institucional? Não seria este condicionamento ao instituído o que tem esterilizado a capacidade criativa dos homens, e neurotizado a sociedade? Então como esperar que sob tais condições o artista provoque transformação?
Esses prêmios evocaram o ressurgimento em minha mente daquela música que diz: ‘Quer ver a foca bater palminha? É dar a ela uma sardinha’. E se repete, se repete.. Como se eu não tivesse mais nada com que me ocupar.
Ao invés de tratar o artista com o habitual extremismo – que ora o endeusa, ora o marginaliza, num infeliz e significativo movimento de distanciamento – deveríamos cuidar de valorizar o ser humano. O que existe de singular em cada um de nós. Do contrário como desenvolver a diversidade? Muito se fala e pouco se empreende a respeito. Salta aos olhos a quantidade ínfima de empreendimentos baseados na diversidade humana. Iniciativa que deveria ser incluída em toda política de ordem pública à fim de semear o respeito e a tolerância entre os ‘desiguais’. O homem tem-se esmagado por excesso de unilateralidade e progresso sem sentido, uma filosofia de vida que agride a natureza humana, que não deveria ser diferenciada da artistica. Independente se uns façam disso profissão e outros simplesmente vivam a arte de Ser o que são.
Estamos ainda no velho mundo. A prova irrefutável da afirmativa está na estratégia pública do critério político destituído do espírito a que dedica investimentos. Uma maneira deslocada de se considerar o ser humano. Embora a vontade política pareça verdadeira, o despreparo quanto ao negócio cultural é grande. Boa parte dos referidos prêmios privilegiam medalhões ou panelinhas universitárias. Perspectiva viciada de um sistema retrógrado que promete acolher uma nova realidade. Retórica. Não há como fazer política em meio a arte. Não sob tais critérios.
Vamos ensaiar aqui um movimento de reorientação da filosofia: Se o critério fosse humano não haveria questão, apenas um mesmo caminho aberto à quem estivesse disposto e apto a trilhá-lo sob critério intrínsecos. Não promoveríamos premiações que alimentam o ideal de sucesso, contemplando alguns poucos, abrindo mão da maioria. Garantiríamos uma perspectiva de subvenção governamental direta que privilegiaria a diversidade de nossa manifestação expressiva. Além disso, ou seja o sucesso, dependeria do próprio caminhar.
Para desenvolver cultura à altura de nossas emergentes necessidades é preciso mudar de paradigma. Novos meios de se fazer política e abordar questões culturais são necessários. A economia criativa nos oferece esse movimento transformador, especialmente na transição dos processos excessivamente unilaterais de motivações extrínsecas, aos processos criativos motivados intrínsecamente. Tudo que for possível fazer no sentido de instituir a economia criativa como estratégia, ou parte da mesma, é proposta de renovação cultural, social, econômica e política. Depois de tanto progresso funcional, seria saudável, por que compensatório, evoluir como seres humanos.
Afinal, podemos ser mais do que bons médicos, escritores, contadores, artistas, etc. Podemos ajustar a bipolaridade humana (termo junguiano) para sermos humanos na íntegra. De reprodução basta o que já passamos e teima em retornar.
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