Publicado originalmente no site da FUNARTE e retirado em 11/02/2002:
Espetáculo 'Noite e Luz' reuniu os belos sambas melancólicos do compositor baiano e a voz rascante da cantora carioca
Por Pedro Paulo Malta
O sambista baiano Batatinha, atração do Projeto Pixinguinha em 1983
Cantor e compositor desde os anos 40, Batatinha nunca esteve entre os nomes mais famosos da música popular na Bahia. Ainda assim, sempre foi sambista dos mais respeitados na terra de Dorival Caymmi, João Gilberto, Caetano Veloso e outros mestres. E foi justamente um desses mestres – a cantora Maria Bethânia – que caiu de amores por seus sambas e resolveu gravá-los a partir de meados anos 60, levando ao grande público a melancolia de Imitação, Só Eu Sei, Hora da Razão e Toalha da Saudade (os últimos três em parceria com J. Luna). Só a partir daí o tipógrafo soteropolitano Oscar da Penha – seu nome de batismo – passou a ter alguma projeção nacional, sendo gravado então por Alcione, Nora Ney, Caetano Veloso e Jair Rodrigues.
Em 1983, dividiu um dos espetáculos do Projeto Pixinguinha com a cantora Elza Soares, com quem se apresentou em Niterói, Fortaleza, Natal, João Pessoa, Recife, Salvador e Brasília. Dirigidos pelo cineasta Iberê Cavalcanti (que batizou o espetáculo com o nome de Noite e Luz), Elza e Batatinha dividiam apenas dois números do repertório: a marcha Todo Mundo Vai ao Circo (de Batatinha), que marcava o início da apresentação do compositor baiano, e o samba Na Baixa do Sapateiro (Ary Barroso), que encerrava o espetáculo. Casada na época com o músico Gerson Alves, eram dele a maioria das músicas do repertório de Elza, a quem cabia a abertura do show, com o samba Malandro (Jorge Aragão e Jotabê). Clique na galeria de áudios para ouvir o espetáculo na íntegra.
Segundo o jornal O Povo, de Fortaleza, o espetáculo não tinha um início convencional: o que se via era Elza Soares “abrindo o show do alto de um camarote, cantando em seguida enquanto caminha entre o público, chorando um amor perdido numa mesa de bar improvisado no palco”. Ainda na edição de 14 de julho de 1983, o jornal contava que na estreia do espetáculo em Fortaleza, no belo Teatro José de Alencar, a caminhada de Elza do camarote ao palco teve uma parada no meio do caminho, onde a cantora cumprimentou uma fã paraplégica.
A mesma matéria trazia aspas da cantora, que definia o Projeto Pixinguinha como “a coisa mais séria no âmbito da divulgação da verdadeira música popular brasileira”. Ela contava ainda que estava produzindo, em parceria com Gerson Alves, um musical sobre a vida do craque Mané Garrincha (falecido em 23 de janeiro daquele ano), com quem viveu 1962 a 77. “Para interpretá-lo quero contar com a participação do Jairzinho, pois acho que ele tem muito a ver com o Mané”, revelou a intérprete, que participava pela terceira vez do Pixinguinha, após turnês em 1980 (com Leny Andrade e Mestre Marçal) e 81 (com Billy Blanco).
Já o estreante Batatinha contou ao diário cearense que devia o início de sua carreira ao cronista pernambucano Antônio Maria, que lhe deu a primeira oportunidade de apresentar suas composições, no programa Campeonato do Samba, na Rádio Sociedade da Bahia. Também foi de Antônio Maria a ideia do apelido que virou nome artístico, mas que custou a cair em suas graças: “Eu detestava, porque me transformava em motivo de gozação dos colegas, que me chamavam de batatinha frita, tira-gosto de bêbado e coisas do gênero.” Amargurado com a falta de acesso às gravadoras, o sambista nascido em 1924 (e que faleceria em 1997) aproveitava para anunciar seu contra-ataque: “O que eles não podem controlar é a criatividade. E esta é a minha vingança, não posso gravar, mas vou criando.”
Na estrada de 7 a 31 de julho de 1983, Elza e Batatinha foram acompanhados por Vitor Mansur (guitarra), Luizinho Braga (flauta), Guaracy de Castro (violão e cavaquinho), Ademir (bateria) e Pedrim Gomes (cavaquinho). Sobre o encerramento da turnê, em Brasília, o jornalista Irlam Rocha Lima escreveu na edição de 2 de agosto do Correio Braziliense: “Era a primeira vez que via, ao vivo, dois artistas que sempre me emocionaram muito.” Na coluna, o crítico de música destacava ainda a garra de Elza Soares (“na tentativa de reconquistar seu espaço na MPB”) e o talento do “velho Batata”, “uma figura da maior beleza e dignidade, no palco ou fora dele”. Leia esta e outras matérias na galeria de imagens.
Mídias deste texto
Áudios (19 áudios)
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Poema do imperador – Elza Soares
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Homenagem ao mestre Cartola – Elza Soares
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Todo mundo vai ao circo – Batatinha e Elza Soares
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Diplomacia / Imitação – Batatinha
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Hora da razão – Batatinha
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Jardim suspenso – Batatinha
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Babá de luxo – Batatinha
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Zaratempo – Batatinha
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Toalha da saudade – Batatinha
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Segredo – Elza Soares
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Segredo (2ª parte) – Elza Soares
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Grito de prazer – Elza Soares
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Oração de duas raças – Elza Soares
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Amor até o fim – Elza Soares
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Enredo de pirraça – Elza Soares
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Alagoas – Elza Soares
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Independente – Elza Soares
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Na Baixa do Sapateiro – Batatinha e Elza Soares
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